sábado, 14 de junho de 2008

Quadrinhos invadem as salas de aula

Programa do MEC e livro para professores estimulam o uso de HQs na educação


Tirinhas em prova da professora Maria da Penha


Nos últimos anos, as histórias em quadrinhos (HQs) têm ganhado espaço na mídia e respeito dos formadores de opinião. Agora elas estão entrando nas salas de aula. Se a inclusão de livros em quadrinhos no Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), do MEC, está levando as HQs para as escolas públicas de todo o país, livros como “Como Usar as Histórias em Quadrinhos na Sala de Aula” estão tentando ajudar os professores a usá-las melhor em suas aulas e provas.

“Como Usar...” foi lançado em 2004 pela Editora Contexto como parte de uma coleção que também inclui outras mídias, como cinema, música e jornais. O livro conta com artigos de vários pesquisadores que são ou já passaram pelo Núcleo de Pesquisas de Histórias em Quadrinhos, da USP. Coordenador do Núcleo e organizador da coletânea, o professor Waldomiro Vergueiro explica que o livro foi pensado para professores de 1º e 2º grau que têm vontade de usar HQs em suas aulas.

“A maior dificuldade na implantação das HQs em sala de aula é que os professores não sabem como usá-las”, explica Vergueiro. “O livro os ajuda a encontrar soluções, dá dicas e faz propostas de uso para áreas como língua portuguesa, artes, história e geografia”, complementa.

No entanto, nem todos os professores precisam dessa ajuda. Maria da Penha Amancio, professora de gramática do colégio Leonardo da Vinci, de ensino médio, diz que usa freqüentemente HQs em suas aulas e provas há pelo menos cinco anos, quando as provas do colégio em que trabalha passaram a ser contextualizadas e voltadas para o dia-a-dia dos alunos. “É um recurso interessante, moderno e de fácil compreensão. E também tem seu lado lúdico. Dá uma quebrada na seriedade das provas”, diz a professora.

Maria da Penha conta também que tem todo apoio da escola. “Está dentro do conteúdo, então não tem como a escola dizer que não pode. É só uma forma diferente de cobrar a matéria”, defende. Ela explica ainda que a língua portuguesa tem conteúdos específicos de oralidade e níveis de fala em que os quadrinhos se aplicam muito bem. “As tirinhas trazem o falar do dia-a-dia”.

A professora utiliza principalmente tiras de jornal – como Mafalda, Calvin e Haroldo e Hagar - e charges em suas aulas, mas Vergueiro diz que esse não é o tipo de HQs mais utilizados nas escolas. Segundo ele, graphic novels – como Maus, de Art Spiegelman e Palestina, de Joe Sacco – são muito utilizados. Ambas as obras falam sobre guerras e podem ser facilmente utilizadas em aulas de história e geografia. “Os quadrinhos infantis também são muito usados, pela maior acessibilidade e pelo baixo custo das revistas”, complementa o professor.

Mas Vergueiro defende que HQs de qualquer gênero podem ser usadas em sala de aula. “As história de terror são boas para aulas de artes, para falar de luz e sombra, por exemplo”, argumenta. Por isso, uma continuação de “Como Usar...” já está sendo preparada. O segundo volume será focado exatamente nos gêneros de quadrinhos. “Haverá um capitulo para adaptações literárias e outro para biografias em quadrinhos”, explica o professor. O livro deve ficar pronto em agosto.

Programa Nacional Biblioteca da Escola

O segundo volume de “Como Usar...” também deve ajudar os professores a utilizar os livros que estão chegando às bibliotecas das escolas através do Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), do MEC. “Seria um desperdício os livros ficarem nas bibliotecas apenas para quem se interessar. A leitura [dos livros] é importante, mas eles devem também ser usados nas salas de aula”, defende Vergueiro.

A lista do PNBE de 2008 inclui livros como “Santô e os pais da aviação”, do autor brasileiro Spacca, “Dom Quixote em quadrinhos”, do também brasileiro Caco Galhardo e “Na Prisão”, autobiografia do japonês Kazuichi Hanawa. Lima Neto, artista e organizador do Festival de Quadrinhos da loja Fnac de Brasília, diz que a lista foi pensada para complementar o conteúdo escolar. “A escolha do material não foi feita para discutir quadrinhos, mas para ter um conteúdo didático”, explica.

O artista acha boa a inclusão de livros em quadrinhos na lista de livros para as bibliotecas escolares por vários motivos. Segundo ele, as HQs funcionam como uma ponte para a literatura, mas não podem ser encaradas apenas assim. “A construção da narrativa através da linguagem gráfica e da retórica da imagem é interessante. [A leitura de narrativas gráficas] pode ser uma habilidade interessante de se estimular”, defende.

Waldomiro Vergueiro concorda. “A maior parte das informações hoje vem de forma gráfica, e as HQs trabalham essencialmente com leitura visual. Vivemos em uma sociedade visual”, diz. Mas Lima Neto chama atenção para a dificuldade dos professores em explorar esse potencial. “Não adianta colocar HQs nas bibliotecas se os professores não souberem como usá-las”,argumenta.

O artista diz ainda que a maioria dos professores estão despreparados para lidar com quadrinhos. “Você tem que ir trazendo as HQs para o meio acadêmico aos poucos, para depois usa-las de maneira efetiva”, defende. Mas apesar das dificuldades, os alunos parecem gostar da iniciativa. “Nunca ouvi ninguém reclamar das tiras”, diz Maria da Penha.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Brasília na tela


Professor de Cinema no IESB, Mauro Giuntini colhe os frutos de seu primeiro longa-metragem


O brasiliense Mauro Giuntini Viana é diretor de cinema e professor do segundo semestre de Cinema e Mídias Digitais no IESB, onde ministra uma matéria chamada Cinema Brasileiro. Já dirigiu filmes publicitários, documentários, curta-metragens e, em novembro de 2007, exibiu no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro seu primeiro longa-metragem, Simples Mortais. Professor há dez anos, Giuntini já deu aulas na UnB, e atualmente também trabalha na Universidade Católica de Brasília.

O diretor nunca teve planos de se tornar professor. “Foi meio que uma surpresa”, diz. No entanto, Giuntini acha que o trabalho de diretor de cinema é muito parecido com o de professor. “Um diretor tem que motivar e coordenar o trabalho em equipe”, explica. Segundo ele o trabalho de professor também dá a oportunidade de dialogar com jovens, que vêem o cinema de uma forma diferente. “Me surpreendo. Vejo coisas novas que sem eles não veria”.

Giuntini é um entusiasta das tecnologias digitais, foco do curso do IESB. “O digital é ótimo para o aprendizado, porque é barato e possibilita a experimentação”, defende. O diretor também acha que a troca da película pelo formato digital é um processo irreversível, apenas uma questão de tempo. “É a terceira grande mudança da história do cinema. A primeira foi a introdução do som, a segunda, das cores, e a terceira é o processo digital”, diz.

Simples Mortais

O primeiro longa-metragem do diretor brasiliense, Simples Mortais, foi captado digitalmente e exibido em película de 35 mm. Giuntini diz que o filme foi muito bem recebido em suas exibições nos festivais de Brasília e Recife. “Simples Mortais recebeu o prêmio de melhor filme em 35 mm de Brasília e os prêmios de melhor ator e melhor ator coadjuvante em Recife”, diz, orgulhoso dos aplausos que seu projeto vem recebendo. O diretor está negociando para o segundo semestre de 2008 a exibição comercial do filme.

Em um cenário nacional em que o cinema está muito voltado para os problemas sociais, Giuntini se destaca ao propor falar da classe média. “A classe média é protagonista social e a diversificação é muito importante. O foco não pode ser só ela, mas temos que falar dela também”, defende o diretor, que acrescenta ainda que essa classe social é o público de cinema no Brasil. Ainda segundo ele, existe no cinema nacional um receio, e até mesmo preconceito, de mostrar a classe média.

Giuntini diz se identificar com a cidade em que nasceu e defende que um diretor tem que primeiro encantar seu quintal para depois encantar o mundo. “Para ser universal, um filme tem que ser regional”, diz o diretor, que usa majoritariamente atores e equipe de Brasília. Segundo ele, além de seus projetos terem orçamentos baixos, a cidade conta com ótimos profissionais e usar atores menos conhecidos do público ajuda no desenvolvimento dos personagens, que não ficam ofuscados pela fama de seu interprete.

Sobre os diferentes tipos de filme que já dirigiu, explica que o objetivo de cada um é diferente e que gostou muito de fazer longa-metragem, onde pode arriscar mais. Segundo ele, curta metragem é explosão, mas longa-metragem é mais intenso. “Não faço cinema para mim, mas para me comunicar com as pessoas. O que me interessa em um filme acontece entre a tela e os espectadores”, diz Giuntini.

Projetos

O diretor brasiliense pretende fazer outros longa metragens, entre eles Plutão em Trânsito, que está em processo de captação de recursos públicos. O roteiro narra a história de um casal separado que continua morando junto tanto pelo filho adolescente quanto por razões financeiras. Segundo Giuntini, “o filme é sobre o preço das mudanças e o desgaste da acomodação”.

No entanto, Plutão em Trânsito não é o único projeto do diretor, que diz ter um filme de temática social sendo roteirizado e um antigo documentário sobre a rua da Igrejinha, na Asa Sul, que está pronto para ser filmado. Giuntini explica que cinema envolve muito dinheiro e muito risco e que alguns projetos acabam se mostrando inviáveis. “Fazemos o que conseguimos fazer”, completa.